março 12, 2011

Religião, Ciência, Psicologia

"Conhece-te a ti mesmo e conhecerás o universo e os deuses."

Tudo, em toda a parte, possui uma ordem, uma lógica, que nos faz interligados. Hermes Trismegisto já dizia que o que está em cima é como o que está embaixo e vice-versa. Muitos já observaram como o átomo e o sistema solar são semelhantes - em termos de massa proporcional do núcleo/sol em relação aos elétrons/planetas e em termos de suas órbitas, por exemplo. E, quando estudamos a psicologia/filosofia (si-mesmo), a ciência/natureza (universo) e a religião/mitologia (deuses), essa máxima délfica acima demonstra cada vez mais a sua veracidade.

Bem ou mal, nosso limite é o sistema solar. A gente sabe pouco lá de fora dele. Sim, houve o telescópio Hubble como pioneiro (que existe apenas há quase 21 anos e que será desativado daqui a mais uns 4) e existiram algumas sondas que mais mandaram informação lá para fora do que trouxeram, mas uma das historinhas curiosas com relação a isso, que me fez pensar, foi a de uma sonda posterior que atingiu uma região de choque, uma camada turbulenta, ao se aproximar dos confins do sistema solar, bem ali perto de Netuno. Os antigos já falavam sobre existir uma espécie de barreira intergaláctica, e Netuno (Poseidon) é o deus responsável pelos terremotos e turbulências. Sempre que a gente chega numa situação limite, também ficamos 'balançados', 'sacudidos'. Universo, deuses, si mesmo, funcionam parecido. Conhecendo um, alcançamos a compreensão dos outros. E o que mais temos para observar, onde quer que vamos, somos nós, e em seguida a natureza.

A religião antiga se aproxima mais da ciência do que da religião moderna. Principalmente porque a religião antiga era centrada em conhecimento, não em dogmatismos como acontece na religião estabelecida pelos cristãos. Antigamente, o culto ao sagrado era uma questão de lógica, de evidência, de racionalidade, de fazer sentido. Inclusive você era justo com o próximo porque isso era parte de uma virtude racional e não porque um messias lhe ensinou a ser assim. Para os gregos, a religião ("theôn timaí" = 'veneração dos deuses') não era tanto uma questão de fé (pistis), sobre a qual não existe nenhum mito (o que existia era ser 'temente aos deuses', o "theoudés" da Odisseia, como uma virtude que garantia as outras), apenas os romanos é que começaram a trazer a noção de fé (fides). O verbo grego pistestai significa algo como "convencer, deixar-se convencer, seguir", e eles não precisavam ser convencidos nem convencer ninguém da existência dos deuses.

Quando nós - reconstrucionistas helênicos - estudamos (e somos tidos como nerds por isso) com a intenção de usar a teoria para orientar a nossa prática, mesmo sem querer acabamos encontrando evidências que nos maravilham e fortalecem nossa identificação com a cultura e os valores helênicos. Se você ler sobre os 3 Logos dos quais fala a filosofia, ler sobre os 3 fogos mencionados no oráculo caldeu, e pensar na estrutura de uma célula demonstrada pela ciência, vai conseguir relacionar essas coisas entre si, e mais uma vez confirmar a máxima délfica. Tanto a filosofia (si-mesmo) quanto o oráculo (deuses) e a célula (universo), falam de algo que cria, de onde partem as coisas; de algo que organiza as informações; e de algo que realiza essa inteligência no mundo sensível, dando-lhe inclusive uma forma física. Você pensa em fazer um copo, você reúne o que precisa para construí-lo e então efetivamente o faz. Existe uma inteligência criadora/organizadora, ela delimita o que vai usar como mensagem, e apresenta esta mensagem ao mundo. Você tem o DNA do núcleo, um meio circulante do citoplasma, e uma membrana que dá forma e permite trocas com o meio. O oráculo caldeu inclusive diz que quem fica nos limites de tudo, como intermediária, guardiã das chaves, senhora das fronteiras, é Hécate. Ela conduz as almas do mundo de lá para o de cá e vice-versa. Ela escolta Perséfone nas suas vindas e idas do submundo à Terra. Eis uma revelação divina que pode ser descoberta através de reflexões filosóficas e observações do universo, sem precisar simplesmente 'acreditar' num mito ou epíteto de Hécate.


Na maioria das vezes, o que nos falta é conhecer esse si-mesmo. Não somos nossos corpos, nosso trabalho, nossa personalidade, nossas habilidades, formações e gostos. O verdadeiro Ser que compartilhamos é outro 'esquema', outro 'lance'. Por isso acredito ser importante que se leia o trabalho dos filósofos e dos cientistas para se entender os deuses, em vez de se ler apenas mitologia e achar que aquilo é história literal. Se os mitos fossem a soma do que deveríamos acatar como verdade, os gregos teriam um livro sagrado reunindo esses mitos, coisa que eles não têm. Não existe um manual; o que você precisa é olhar para si e olhar em volta. Só assim vai perceber os deuses em tudo isso que há por aí, inclusive em você e no outro.

4 comentários:

  1. Nossa, amei o texto e antes de lê-lo estava realmente pensando na questão mito-culto, a questão do mito como símbolo, como linguagem, como mensagem e não como regra!

    Tudibão, como sempre!

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  2. Obrigado, Alex, o seu texto confirma que eu estou no caminho certo.

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  3. Fico feliz que o texto encontre ressonância em vocês. :)

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  4. Adorei o texto Alexandra!!!
    Nestes ultimos dias, com a descoberta de uma molécula semelhante(ou o próprio) Boson de Higgs,lí sobre a teoria científica do início do universo, e ví grande semelhança com o livro de Hesíodo, a Teogonia. Que mostra esse início de maneira poética e divina

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