Nos dias que envolvem o solstício do final de ano (inverno para a Grécia e verão para o Brasil), há a celebração moderna da Heliogenna, sugerida inicialmente para 9 dias, mas também adaptada para 3, 2 ou 1 dias. A explicação do festival você pode ler lá no site, clicando AQUI. Mas o que eu gostaria de falar nesta postagem é sobre os mitos.
Vendo o que se celebra, percebemos principalmente Hélio, Faetonte, Selene, Éos, Hécate, Hades e Perséfone. Então embora a ligação entre Hélio (sol), seu filho Faetonte (brilhante), Selene (lua) e Éos (aurora) seja mais óbvia, algumas pessoas poderiam perguntar o que os demais têm a ver com eles. Hécate, a do toucado cintilante, talvez seja mais fácil, por ela ser uma das filhas da noite e deusa da lua, carregando uma tocha. Mas esses deuses também têm mitos em comum, que vamos já saber. Também vamos perceber que é curioso não termos Ártemis incluída na Heliogenna, mesmo ela sendo considerada uma deusa lunar e figurando nos mitos correspondentes. Embora, se incluíssemos Ártemis, tivéssemos que trazer o solar Apolo também. Provavelmente não fazemos isso por conta de ser um festival dirigido a deuses de gerações anteriores à geração deles.
Seguem os breves relatos:
Hélio-Hades-Perséfone-Hécate
Em certo sentido, o deus do submundo Hades ("o invisível, o que dá a invisibilidade") parece muito mais um reverso de Hélio ("o visível, o que torna visível") do que do deus celeste Zeus. Quando Hades raptou Core, que assim virou Perséfone, ela gritou por ajuda, mas ninguém ouviu, exceto Hécate, na sua caverna, e Hélio. Depois o eco de sua voz alcançou sua mãe Deméter. Por nove dias ela andou pela terra com duas tochas nas mãos, à procura da filha. Na terceira manhã, Hécate - também com uma tocha - lhe trouxe notícias, dizendo que ouviu o grito, mas não ouviu quem tinha sido. Deméter perguntou então a Hélio e este lhe disse o que aconteceu. Aí vem todo um enorme relato de Deméter deixando o Olimpo e punindo a terra com a ausência de colheitas, e Iambe e Metanira em sua estada em Eleusis etc, que não cabe agora, e sim em outro festival. Quando Perséfone reencontra sua mãe, elas ficam abraçadas e, em seguida, vem Hécate acolher Perséfone também, passando a ser companheira delas.
Hélio-Hécate-Perséfone
A mãe de Hélio, Téia, recebia presentes de ouro, como Perséfone. A esposa de Hélio, Perse ou Perseida (com quem teve quatro filhos), era um outro nome de Hécate, "deusa que brilha amplamente". Perséfone também poderia ser uma forma mais cerimoniosa de Perse. Outra amada do deus-sol era Neera, "a nova", ou seja, a lua nova, em sua fase mais escura. Com ela, Hélio teve duas filhas. Com Climene (também chamada de Merope, "a de face virada", referência ao eclipse), ele teve sete filhas e um filho, Faetonte.
Hélio-Faetonte
Faetonte era um jovem deus do sol que uma manhã subiu no carro do pai, ergueu-se alto demais e caiu, à semelhança da estrela-da-manhã que se levanta muito cedo e logo desaparece. Ele caiu no rio Erídano e, às suas margens, suas irmãs solares o prantearam. De suas lágrimas surgiu o âmbar.
Hélio-Selene-Hécate-(Ártemis)
Hélio era irmão de Selene e de Éos. O nome Selene está ligado à palavra "selas" (luz) e "mene" (feminino de "men", que significa lua, o mês lunar). Com Zeus ela teve Pândia, "a que brilha inteiramente, a inteiramente brilhante", referência à lua cheia. Selene e Hélio eram tão fraternais quanto Ártemis e Apolo, nunca se casando entre si. Aliás, Apolo e Ártemis tinham um epíteto de Hécaton e Hécate, respectivamente, o que nos liga de novo a Hécate, "a distante", embora ela seja uma das deusas mais próximas da humanidade - como a lua é mais próxima da terra do que os planetas. A história de Ártemis como deusa da lua crescente, fechando o trio Selene-Hécate-Ártemis, parece se dever mais ao fato de ela ter um arco, que lembra o crescente, e ser irmã do solar Apolo, já que isso não se aplicava à Ártemis Táuria, Arcadiana ou Efésia.
Hélio-Éos-Selene-(Ártemis)
Éos é a deusa da manhã, da aurora, a deusa do trono de ouro, e outro reverso feminino do sol, sendo uma irmã mais selvagem e turbulenta do que Selene, visto que as histórias de amor de Éos eram mais apaixonadas que as da própria deusa da lua. Dos jovens que ela amou, muitas vezes só se conhece o nome. Em uma das histórias, ela disputou Céfalo com a esposa dele, Prócris, uma heroína que tinha características lunares. Em uma ilha grega, contava-se que Céfalo se uniu a uma ursa, animal associado a Ártemis. Pode ser que Céfalo ("cabeça") seja a cabeça da constelação de Órion, outro amado por Ártemis e Éos.
[Consultas: livro "Os Deuses Gregos", de Karl Kerényi, e Theoi project.]
Espero que, além de fazer conhecer os mitos, isso auxilie as pessoas a não verem os deuses apenas como personificações (ainda mais tão diretas), como se houvesse apenas um deus para cada coisa no mundo ou que cada deus só regesse um único domínio da realidade...
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